domingo, 8 de novembro de 2015

Tendências

Ignoro o reflexo no espelho
antes mesmo de saber se era eu.
Não quero estar em lugar nenhum
muito menos em mim.

Deixo que me escorra 
por entre os dedos,
os motivos que um dia usei 
para justificar a insistência.

Abandono os ideais
espalho-os ao vento
para que me deixem
dormir em paz.

Largo as emoções
à própria sorte,
para que se percam,
nos labirintos de ser.

Engarrafo as lembranças,
e lanço-as ao mar
para que tentem a sorte
em outro tempo e lugar.



08 de Novembro de 2015,
I.B.

Enredo

Quero estar em alguma ficção louca
no silêncio perturbador antes do ataque
num roteiro não ensaiado
bagunçar a estática, sobreviver ao caos


quero esquecer a ordem, 
as palavras, os porquês
sair sem me despedir
vencer batalhas que não comecei


quero tudo assim sem rima,
sem motivo e sem pontuação
não quero mapas, nem sentidos


quero seguir alguma intuição vazia de si
chegar aos confins da terra e me encontrar lá
e enfim, despedir-me de mim.



08 de Novembro de 2015,
I.B.

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Ela mesma e suas variantes

Lhe disseram que havia mais
E ela quis mais
Não porque alguma ausência lhe fizesse doer o peito,
mas porque sempre existia espaço para o desconhecido.

Lhe falaram do mundo,
e ela quis o mundo.
Não para subjuga-lo à garras tiranas,
mas para fazê-lo sua casa, sua pátria.

Lhe ensinaram a competir,
e ela quis ganhar de todos.
Até descobrir que o maior desafio era superar-se.
Decidiu então que a vitória estava em liquidar os próprios monstros.

Lhe disseram que ela tinha que ser apenas uma,
mas ela sentia-se mover em todas as direções.
Optou por não fazer de si mesma uma prisão,
quis ser todos e e tentar todos os caminhos.

Lhe apresentaram o impossível,
e ela quis alcançá-lo.
Não que o possível a entediasse,
mas porque impossível tinha um sabor ainda não descoberto.

Descobriu o novo,
e quis responder ao seu chamado.
Não que fosse obrigada,
mas porque sua natureza a impulsionava a isso.




26 de Agosto de 2015,
I.B.

Poema inspirado em Alana Pacheco, uma grande amiga e uma pessoa fantástica (e cientista).

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Descômodo

Tentei te tirar de mim,
esquecendo qualquer coisa que ainda nos ligasse,
mas você era como presença física,
em um cômodo quase sem mobília.

Troquei as coisas de lugar,
negligenciei as lembranças amareladas em um canto.
Quis tirar a mobília, para seu desconforto,
mas você continuava lá.

No completo fracasso de minhas ações,
decidi que quem precisava ir era eu,
já que você parecia não querer se mover.
Desde então, tenho me mantido fora de mim.

Quando às vezes por descuido,
volto aquele cômodo,
me deparo com você por todo o lado.
E de novo me retiro de mim.

Vagando por aí comigo,
há uma esperança persistente,
que em algum momento encontre o cômodo vazio,
e na sua ausência, decida retornar à mim.



25 de Agosto de 2015,
I.B.

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Diálogo #7

-Não sabia que você fumava.
-Eu nem gosto. Deixa um gosto horrível na boca.
-Alguma outra explicação pra esse cigarro aceso?
-Estou com raiva.
-E?
-Estou com tanta raiva, que acho que não pode terminar em um sentimento intenso e imediato. Precisa deixar um gosto ruim na boca.


10 de Agosto de 2015,
I.B.

Diálogo #6

-Sabe, eu aprendi uma grande lição a respeito da liberdade hoje...
-Legal, e qual foi?
-Bom, já que eu sou adulto e faço faculdade, eu tenho a liberdade de faltar uma manhã inteira de aula chata simplesmente pra ficar dormindo.
-Nossa, grande lição.
-Não foi essa a lição que aprendi.
-Não!?
-Aprendi que o professor tem a liberdade de passar um trabalho a ser entregue nessa mesma manhã, valendo a metade da nota, justamente no dia em que eu decidi faltar a aula.


Izuara Beckmann,
10 de Agosto de 2015.

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Aos Poetas Anônimos



Sou da época dos grandes poetas,
da oitava e dois terços dos sonetos.
da procura árdua do encaixe perfeito,
das sílabas tônicas e sua melodia.

Vejo agora pelos olhos de tantos poetas,
ruas que nunca morei,
quitandas em que nunca entrei,
e um tabaco diferente do que costumava fumar.

Vi escorrer poesia por mãos anônimas,
em computadores nos cafés,
em guardanapos nos bares,
em muros dessa cidade que nunca pisei.

Vi tanta coisa transformada em poesia,
até ver um poeta escondido em cada um,
e seus poemas de gaveta,
de panfletos,
fotográficos,
em livros de início de carreira.

Tantas maneiras diferentes de organizar os versos,
descaso com a rima,
com a estrutura,
com a sonoridade,
e ainda assim era poesia.

Eram banalidades,
olhares repentinos,
sentimentos momentâneos,
dia-a-dia, 

poesia.



Izuara Beckmann,
05 de Agosto de 2015.




Partindo de um writing prompt: Escreva como se fosse um poeta morto.

terça-feira, 12 de maio de 2015

Descompasso

Há certa poesia no descompasso,
na desarmonia rítmica daquele sujeito.
Faz questão no desacordar de seus passos com a música,
aqui onde ninguém mais está dançando.

Há certa poesia em não se importar,
parece não reparar os olhares críticos.
Ignora os sussurros que lhe dizem respeito,
Aqui onde todos fingem dar atenção.

Na pausa momentânea entre uma música e outra, 
o sujeito para
assimila o novo ritmo
e torna a descompassar.

Talvez seja louco.
Talvez seja poeta.
Izuara Beckmann,
10 de Maio de 2015.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

O fim, e tudo que se segue


Só preciso saber o que há no fim da clareira.
Não importa o dia, o trabalho, o cinema.
Importa que eu estou lá,
importa que eu sinto o que ele sente,
respiro por sua respiração,
um só coração, sinto o pulso acelerar.

Ele não sabe que estou lá.
Ele não sabe que vejo dentro de sua mente,
que conheço seus pensamentos.
Talvez esse seja o pior tipo de intromissão,
mas sejamos honestos, o acompanho desde o início...
desde que caminhava pelo deserto.

Não sei se me fiz personagem, ou a personagem sou eu.
Em algum momento deixei de ser a espectadora
de uma história narrada em minha mente
e me tornei participante parte ativa.
Passei por suas dores e derramei suas lágrimas,
sorri suas alegrias e vivi seus longos dias.

Agora aqui estamos. O fim, a clareira.
Sentimos o frio na barriga,
respiramos pausadamente.
E damos os últimos passos.
Quem pode dizer que serão os últimos?
Talvez nos reste o posfácio e a redenção.


Izuara Beckmann,
17 de Janeiro de 2015.